domingo, 23 de setembro de 2012

a tuba

Coqueiros parecem vigias felizes
Que zombam do tempo que engole os humanos
E assim passam dias e meses e anos
Não cedem, não cansam, não tem cicatrizes
Mas o tempo aponta pra suas raízes
E as águas começam a se aproximar
Roendo as entranhas pra lhes derrubar
Que nem condenados, pendendo, penosos
Nos braços dos ventos morrendo orgulhosos
Cantando ciranda na beira do mar
 (...)
Me sento nas pedras que nas marés cheias
As águas procuram pra se arremessar
Que nem combatentes que vem guerrear
Sem ter esperança de fama ou de glória
Se acabam em espuma, se apagam da história
Cantando ciranda na beira do mar

*do Siba.

sábado, 8 de setembro de 2012

second album syndrome?



Black Sabbath(70)-Paranoid(70)

The Stooges(69)-Fun House(70)

Are You Experienced(67)-Axis: Bold as Love(67)

Zeppelin(69)-Zeppelin II(69)

Monster Movie(69)-Soundtracks(70)

Iron Maiden(80)-Killers(81)

Turn On The Bright Lights(02)-Antics (04)

The Doors(67)-Strange Days(67)


Slanted and Enchanted(92)-Crooked Rain, Crooked Rain(94)

Queens of the Stone Age(98)-Rated R(00)

Is This It(01)-Room On Fire(02)

Caetano Veloso(68)-Caetano Veloso(69)

Os Mutantes(68)-Mutantes(69)

Velvet Underground & Nico(67)-White Light/White Heat(68)

Blue Album (94)-Pinkerton(96)

Freak Out!(66)-Absolutely Free(67)

Unknown Pleasures(79)-Closer(80)

Five Leaves Left(69)-Bryter Layter(70)

Funeral(04)-Neon Bible(07)

Kill ‘Em All(83)-Ride the Lightning(84)


Surfer Rosa(88)-Doolittle(89)

Gish(91)-Siamese Dream(93)

Smiths(84)-Meat is Murder(85)



terça-feira, 4 de setembro de 2012

Um sonho "doce"


Recife [PE] - Em uma estrada vicinal em Jardim Paulista, bairro de um município da Grande Recife, uma aglomeração inquieta de moradores das redondezas, a maioria de chinelos e alguns com chapéus de palha. O barulho era o de sirenes das viaturas das Polícias Militar e Civil. Tinha chovido na noite anterior, então o terreno que levava aos populares estava mergulhado em uma lama espessa, suja e amarelada, passando por toda uma extensão de dois quilômetros que a chamada Mata do Ronca possuía.

Logo na entrada da estrada, uma Parati no alto de seus 20 anos de idade, abandonada. As rodas levadas, a carcaça removida. Um esqueleto metálico. Cerca de 500 metros à frente, o conhecido círculo que se forma em volta de um cadáver. Pequenas inclinações para frente, silêncio.

No chão, com o rosto estatelado e imerso na sujeira, um homem, com a cabeça estourada e o sangue misturado à lama e água suja. Vestindo vermelho, estava de olhos fechados. Tiros na cabeça e na nuca, execução sumária. Mais alguns passos e as viaturas policiais, piscando em vermelho. Em pé, dois delegados discutiam procedimentos administrativos. Apoiados nos galhos, homens armados e fardados. Polícia Militar de Pernambuco. Ao lado deles, um camburão do Instituto de Medicina Legal (IML), da cor branca, que só ele possuía. O resto era um mar de verde, amarelo e marrom.

"Lá atrás tem outros dois, vai lá ver", disse uma senhora castigada pela idade. Chegando "lá atrás", outro corpo estirado na terra batida, marcado de vermelho puro, prestes a ser colocado no saco dos peritos médicos. Próximo a ele, um Fiat Uno completamente carbonizado, pneus derretidos, barras de ferro retorcidas. "Cadê o outro?", pergunto ao delegado. "Dentro". Me mostrou.

No banco traseiro, um tronco, algo parecido com madeira. Era uma pessoa, ou pelo menos foi o que me disseram. Ali, uma massa disforme carbonizada, estranha. "Um crime de execução sumária", repetia um dos policiais.

O primeiro homem, de 33 anos, era um taxista, amigo das outras duas vítimas, mortas sem chance de defesa. Segundo o delegado, ambos eram ex-presidiários e agora cumpriam regime condicional em Paulista. "Ainda não sabemos as linhas de investigação, mas pelas circunstâncias, tudo indica que assassinaram o taxista por ele estar com os ex-presidiários, um deles morto queimado dentro do veículo. Acredito que acenderam o step com gasolina e queimaram o veículo”, palpita o guarda. “Talvez eles tenham alguma ligação com algum crime praticado recentemente ou rixa, o que deve ter motivado a brutalidade dessas ações.”

Enquanto explicava o caso, os corpos foram parar dentro dos sacos do IML, pessoas em volta olhando sem muita reação, como quem está acostumado a tal tipo de crime.

"Me assustar, por que? Ninguém faz nada por aqui, onde eu moro. Não dou tanta atenção. Só fico bem porque não foi nenhum dos meus filhos ou conhecidos", contou uma senhora. Uma outra, com medo de represálias, limitou-se a um murmurante "a vida continua, né?" O rosto estava coberto por rugas e um chapéu gasto pelo tempo. Corpos recolhidos, o carro do IML deu partida, enquanto começou a cair a chuva do dia anterior.

Os pessoal que ali tinha se juntado começou a correr de volta para sabe-se lá de onde vieram. Com medo de um atoleiro, saímos dali até dar nas margens da BR-101. Tocava Molejo na rádio FM e um menino olhava para o fotógrafo que me acompanhava e pedia uma foto, sorrindo. Vestia uma camisa desbotada do Sport Clube do Recife, estava descalço e parecia não se importar muito com isso.

_realidade amarga
Nos arredores do local dos assassinatos, uma pracinha onde outros meninos jogavam futebol – na chuva – e alguns taxistas conversavam em um ponto, ao lado do terminal de ônibus da localidade conhecida como Jardim Paulista Baixo. Depois de algumas perguntas e entrevistas, me indicam a casa de um senhor, ali perto, ao lado do bar com o irônico nome de “Sonho Doce”.

Era o pai de Vinicius, um dos rapazes mortos no crime. Na frente da casa, alguns carros de imprensa e populares rodeando o local, como que em frenesi. Os muros, que já foram brancos há uns cinco [cinco?], dez anos, agora eram cinza escuro. Na sala da casa, um senhor gordo, trajando camisa branca e óculos de grau no rosto. Olhava para baixo enquanto era bombardeado pelas perguntas dos repórteres. “Ele estava metido com drogas?”; “Quanto tempo ficou preso?!”; “Qual a relação dele com os outros dois?”.

Fitava o chão, a mulher do lado, também sem muita expressão. Nenhum dos dois chorava, apenas estavam ali, estáticos. Alguém perguntou como ele se sentia. Dançando no Hopi Hari certamente que não, mas fizeram a pergunta, de qualquer forma. “Você vai trazer meu filho de volta? Que te importa o que eu estou sentindo?”, respondeu, com repreensão no olhar. Não olhava para nenhum dos jornalistas ou para qualquer pessoa que estivesse naquela casa. Simplesmente ficava sentado no sofá, como que pensando.

Eis que então a casa esvaziou e ele ficou lá, paradinho. Do lado de fora, no bairro de Jardim Paulista, onde o sofrimento é interpretado sob a forma de um silêncio sepulcral, os garotos continuavam jogando futebol. O Sonho Doce se resume ao bar.

Ainda que a violência estivesse ali escancarada, brutalizada nas ruas de lama daquele lugarejo, senhoras carregavam sacolas com tomates e repolhos. “Ô de casa!”, dizia o entregador de água, por ali. Ali do lado dos três fuzilados em uma mata vicinal.

Texto que, escrito em 2007, só foi achado hoje, depois de mais de cinco anos de procura. Já tinha desistido dele quando, do nada, reapareceu. Engraçado como as coisas voltam.